Mais de 5.000 anos atrás, um grupo nômade de pastores saiu das estepes da Europa Oriental para conquistar o resto do continente. O grupo, hoje conhecido como cultura Yamna, trouxe consigo uma nova tecnologia inovadora, os carrinhos com rodas, que lhes permitiram ocupar rapidamente novas terras. Há mais de 4.500 anos, os descendentes dessas pessoas chegaram à Península Ibérica e exterminaram os homens locais, de acordo com uma nova pesquisa de uma equipe de cientistas internacionais.

“A colisão dessas duas populações não foi amigável; em vez disso, os homens que chegaram quase completamente expulsaram os homens locais”, explica David Reich, um professor de genética da Universidade de Harvard que apresentou os resultados da pesquisa em um evento organizado pela revista New Scientist em 22 de setembro de 2018, antes da publicação do estudo.

40% da informação genética e 100% dos cromossomos Y vêm dos migrantes.

A chegada dos invasores hostis ao que hoje é a Espanha e Portugal teve “um impacto genético rápido e generalizado”, disse o cientista espanhol Íñigo Olalde em uma conferência há duas semanas em Jena, Alemanha. De acordo com Olalde, durante a Idade do Bronze, as populações subsequentes tiveram “40% de suas informações genéticas e 100% de seus cromossomos Y dos migrantes”.

Dado que as crianças herdam o cromossomo Y de seus pais, “isso significa que os homens que chegaram tiveram acesso preferencial às mulheres locais, repetidamente”, disse Reich no evento de setembro.

O estudo, que analisou o DNA de restos mortais de 153 indivíduos desenterrados na Península Ibérica, está previsto para ser publicado numa das mais importantes revistas científicas do mundo. Nem Reich nem Olade, ambos da Universidade de Harvard, quiseram dar mais detalhes. O geneticista Carles Lalueza-Fox, do Instituto de Biologia Evolutiva de Barcelona, também trabalhou na pesquisa.

Três anos atrás, outra equipe de pesquisa liderada por Reich sugeriu que as línguas indo-europeias — a família linguística à qual pertencem a maioria das línguas europeias — se desenvolveram por meio da cultura Yamna e seus descendentes.

O historiador Roberto Risch, da Universidade Autônoma de Barcelona, disse à EL PAÍS na época que as descobertas da escavação de La Bastida, na região sudeste espanhola de Murcia, haviam revelado “uma grande surpresa”.

A arqueologia revela uma sociedade hierárquica que rompeu com o antigo igualitarismo do início do período Neolítico, diz o historiador Roberto Risch.

“Percebemos que a Península Ibérica não foi colonizada apenas pela primeira onda migratória neolítica, há 8.000 ou 9.000 anos, mas também por outra posterior, há 4.500 anos, que trouxe consigo uma cultura muito diferente”, disse ele.

Machados de guerra e carroças com quatro rodas podem ser encontrados nas camadas de terra que datam de 4.500 anos. “A partir de então, quase todos os túmulos dos homens foram preenchidos com armas, adornos, exibições de riqueza. A arqueologia revela sinais marcantes de uma sociedade hierárquica que rompeu com o velho igualitarismo do início do Neolítico”, disse Risch.

As descobertas da equipe de pesquisa de Reich também são apoiadas por um estudo publicado no ano passado pelos geneticistas Dan Bradley do Trinity College em Dublin e Rui Martiniano da Universidade de Cambridge. Esta equipa de investigação anunciou ter descoberto uma “descontinuidade” no cromossoma Y durante a Idade do Bronze na Península Ibérica, após estudar o DNA de restos mortais de 14 pessoas encontradas em sítios arqueológicos em Portugal.

“Sobre o motivo da substituição do cromossomo Y, poderíamos especular que as populações das estepes tinham tecnologia superior, armas melhores e também cavalos domesticados que poderiam ter dado uma vantagem na guerra”, diz Martiniano.


Tradução do texto The invasion that wiped out every man from Spain 4,500 years ago, escrito por Melissa Kitson.

Nota: O texto original é de 2018, e a pesquisa mencionada por ele foi publicada na Science do ano seguinte. Você pode ler o artigo clicando aqui.

Mário Pereira Gomes
Mário Pereira Gomes

Graduado em História (UFPE), transhumanista e divulgador científico.

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